O crescimento do reconhecimento público da cantora
Lila Downs transforma hoje um álbum novo como "Pecados y Milagros" num
acontecimento. A artista mexicana, de visual carismático semelhante à da
pintora compatriota Frida Kahlo - vestidos coloridos, tranças e
adereços índios, pele morena -, é hoje um dos grandes ícones da world
music e uma das grandes embaixadoras da música mexicana, à custa de uma
agenda ao vivo bem preenhida, de participações em bandas sonoras de
filmes (o passo mais significativo é, sem dúvida, o biopic "Frida") e, acima de tudo, de uma discografia exemplar.
"Pecados y Milagros", com a militância política e
as referências à religião católica sempre à superfície, é outro caldo
cultural, que estica o manifesto de Lila Downs entre a cultura indígena
(especialmente da sua região de Oaxaca) e a ocidental (laivos de
pop-rock e até de electrónica), entre a disposição intimista das
rancheras mexicanas e a festa folclórica das cumbias. Nada que
surpreenda, portanto. Downs habituou-nos, e bem, a isto.
O sétimo álbum de estúdio da cantora
centro-americana, assente na língua castelhana, divide-se entre
composições originais (de Downs e do seu marido e colaborador Paul
Cohen) e muitas versões, desde temas de músicos pop mexicanos como Marco
Antonio Solís a monstros das rancheras como José Alfredo Jiménez e Cuco
Sánchez, o clássico do estilo huapango, 'Cucurrucucú Paloma' (que
Caetano Veloso também canta no filme de Pedro Almodóvar, "Fala com Ela")
ou o grande tema que imortalizou o compositor mexicano do século XIX
Macedonio Alcalá, 'Dios Nunca Muere'. As secções de metais mariachi
colam-se como um íman às canções, e há, inclusive, momentos de festança,
como 'Zapata Se Queda' que se podia misturar no meio do reportório de
Manu Chao.
Mas há uma diferença, substancial, face ao que
recebíamos de Lila Downs. A sua música vinha sendo uma estalada que nos
acordava do desmaio da mediania com que nos confrontamos amiúde. Mas
"Pecados y Milagros" é Lila Downs em regime light
e facilitista, para consumo externo acessível, que amolece não só a
força autêntica que lhe conhecíamos como a dos temas nos quais pegou:
'Vámonos' e 'Fallaste Corazón', derivados das mãos de Jimenez e de
Sánchez para Downs, passam a banais.
"Pecados y Milagros" é uma espécie de postal
turístico de Oaxaca - simpático, leve. A excepção clara é 'Xochipitzahua
(Flor menudita)', um minuto etéreo de Primavera, num lindíssimo falsete
de Downs. A partir da faixa seguinte, a nº 10 'Palomo del Comalito',
volta tudo ao normal, à vulgaridade. (Cotonete)
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